sábado, 19 de junho de 2010

Um novo começo



Elas viviam silenciadas, o prazer era profano aos outros olhos, mas elas se amavam intensamente, sob a luz da lua e dentro de seus quartos, com as luzes acesas, e, por um único instante, se esqueciam do mundo, das dores, dos filhos, das roupas para lavar e da constante obrigação de se anularem cada vez mais.







Muitas mulheres nasceram, casaram-se, tiveram filhos, foram escravizadas e morreram em função de uma sociedade patriarcal, machista, mas não se esqueciam nunca de sua mente capaz, de seu coração ardente e do seu sexo pulsante. Umas acreditaram que nada podiam fazer, outras foram à luta para poderem acontecer.






Essas mulheres, amantes, mães, trabalhadoras, deusas, aos poucos foram conseguindo seu espaço, sua inclusão na sociedade, viveram e morreram, para nós hoje podermos desfrutar de intensa liberdade. Elas saíam à luta, à guerra todos os dias, reivindicando um direito que a elas era negado: o direito de amar. Amar não um amor imposto, obrigado e escravizado, mas um amor puro vindo delas mesmas, o poder de decidir a quem amar, escolher seus homens ou ficarem sozinhas, ou até mesmo o direito de amar umas às outras. Por que não? Por que limitar o amor a uma classe, um grau, um gênero? O amor dessas mulheres foi tão longe e tão intenso ao ponto de perceber que se podia amar uma irmã, seu corpo, seus gostos, seus defeitos, seus jeitos e seu sexo.


BY:Black Ópico

Essas guerreiras, amantes entre si, se espalharam por todos os lugares, irradiando as diversas possibilidades a todas as mulheres do mundo, que aos poucos foram se libertando das amarras impostas, e hoje vivem com orgulho de serem livres, de serem lésbicas e de possuírem o dom supremo do amor.



Rosely Roth foi uma dessas mulheres. lésbica, militante e guerreira, brigou com unhas e dentes e ao mesmo tempo com simplicidade e amor para viver em uma sociedade mais justa e respeitadora.



Quando o Brasil se calou e se curvou diante de Figueiredo e seu governo ditador, Rosely se ergueu diante da multidão e levantou com ela dezenas de outras mulheres que também acreditavam que podiam mudar o mundo.



Em uma ocasião Rosely Roth foi ao programa da apresentadora Hebe Camargo, ao vivo, em rede aberta, defender uma filha lésbica de uma mãe homofóbica. A mãe, revoltada, estava a ponto de agredir Roseli, que permanecia calma e serena, apesar de possuir todos os motivos para revidar os insultos e provocações dirigidos a ela. Após o ocorrido, o programa ficou proibido de ir ao ar ao vivo. A apresentadora, então, comprou a briga, dizendo que ela não tinha culpa por Roseli Roth ser uma lésbica inteligente, o que fez com que todo o brasil acompanhasse o caso, dando muito crédito à comunidade lésbica.





O grande dia





No dia 19 de agosto de 1979, em São Paulo, aconteceu o mais importante protesto lésbico ocorrido até hoje no Brasil. Em plena ditadura, quando poucos se arriscavam a exercer o direito negado da liberdade de expressão, lésbicas de São Paulo lideradas por Rosely Roth deram seus gritos por uma sociedade mais justa, menos machista e menos homofóbica.



Elas eram freqüentadoras do Ferros Bar, um ponto GLS da cidade, e foram proibidas de entregar o jornalzinho “Chanacomchana” dentro do estabelecimento. Revoltadas com a atitude da administração do bar, já que eram elas mesmas que o sustentavam, organizaram um protesto na frente do estabelecimento, onde foram até mesmo proibidas de entrar.



O ato deu o que falar, pois estavam presentes, além de toda a comunidade GLS e simpatizantes locais, policiais, políticos e vários veículos de comunicação, que estavam dispostos a notificar o evento.



As mulheres que foram à luta podiam muito bem parar de freqüentar o bar, e este com certeza fecharia, mas não podiam se calar, e perder mais um lugar, entre os poucos que restavam para se reunir, e se divertir. Venceram, e distribuíram o “Chanacomchana” para todos os presentes, inclusive ao dono do bar que deixou bem claro que queria ser o primeiro a ler o jornal.



Em maio de 1981, ocorreu a primeira reunião de grupo lésbicos organizados no país. Hoje, centenas de grupos se reúnem para estudar novas idéias e propostas para melhorar a qualidade de vida e o reconhecimento da comunidade lésbica. Em 2002, houve uma proposta de se resgatar a beleza dos fatos históricos que envolveram a história do orgulho lésbico brasileiro, retratando os fatos e as percursoras da nossa história.



Em 19 de agosto de 2003, a coordenadoria de lésbicas da Associação da Parada do Orgulho GLBT de São Paulo comemorou pela primeira vez o Dia do Orgulho Lésbico no Brasil, com a retratação dos fatos históricos, bênçãos religiosas e apresentações de vídeos, músicas e poesias com a temática homoafetiva e homoerótica. O evento abordou a luta das mulheres lésbicas no Brasil por todos esses anos e refletiu sobre como podemos nos orgulhar de sermos mulheres, lésbicas. De sermos nós mesmas.



É importante para nós lésbicas reconhecermos que temos uma história, que somos fruto de uma luta de décadas por aceitação e respeito. Lembremos essa data, como um marco para podermos dizer a todos que nós temos orgulho de ter vencido muitas batalhas e que temos orgulho de continuar lutando para termos mais respeito da sociedade em que vivemos. E que temos muito orgulho de ser o que somos.

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